Os golpes pela internet cresceram tanto que não é de surpreender que tenham chegado ao Instagram, antes um vertedouro inesgotável de coisas belas da vida. Quem ainda não se sentiu atraído a comprar artigos de primeira por preços de terceira, com o único inconveniente de a oferta ser falsa e oferecida por vendedores inexistentes. Todo cuidado é pouco.
Mas alguém já se viu envolvido num esquema caritativo nascido no Insta? Alguém já se envolveu com alguém que usa a rede social para angariar aquele perfil bom samaritano que você guarda bem guardadinho para não ameaçar sua estrutura unha-de-fome? Eu já!
Tudo começou na manhã de 2 de dezembro passado, quando uma desconhecida pediu licença para me mandar mensagem. Como tenho às vezes contatos com estudantes de jornalismo querendo falar sobre reportagem policial – tudo graças ao ‘Manual de Repórter de Polícia’, que parei de atualizar em 2012 – autorizei. Mas ela não era estudante.
Depois de dizer que me admira, que sou incrível e muito bom no que faço, ela mostrou suas garrinhas:
“Eu tô completamente sem nada, nada mesmo pra me alimentar, e inclusive na resistência desde ontem, no almoço, que foi minha última refeição, hoje meu aniversário pra completar e já está sendo um péssimo dia… Acordei e todos os meus pensamentos estão em desistir de tudo, quando na verdade só quero ficar bem. Triste por mais um ano sem minha mãezinha aqui, talvez não estaria passando pelo mesmo. Você poderia me doar, me ajudar, me presentear com 1kg de arroz, 1kg de feijão e algumas batatas? Pra que eu possa fazer um ranguinho pra mim hoje, mesmo que sozinha… Seria um grande presente pra mim.”
Seu choramingo durou ainda umas quinze linhas. E, embora eu não tenha qualquer pendão de sair distribuindo por aí migalhas de minha parca aposentadoria, confesso que seu relato quase me comoveu. Resolvi ajudar menos pela comoção do que pela certeza de que ela não iria desistir enquanto não me convencesse. Calculei o preço das coisas que ela pedira e fiz um Pix de vinte reais.
Faltou pouco para ela dizer ‘só isso?!’, mas ela deixou claro que minha contribuição era insuficiente para o arroz/feijão/batata de sua sonhada refeição. “Só dá mesmo pro arroz, que aqui custa treze reais o quilo”. Mas aí não era mais problema meu: ela que comprasse arroz mais barato, procurasse o CRAS, fosse atrás de uma cesta básica… Para quem não tem o hábito de doar, vinte reais é uma extravagância! Se fosse desejo dela que eu ampliasse minha generosidade, que perdesse as esperanças.
O tempo passou, eu tinha me esquecido de meu arroubo de generosidade, quando, na manhã de domingo, 2 de fevereiro, ela reapareceu. Não houve a sequência inicial de encômios e ela sequer gastou aquele monte de linhas para justificar-se. Foi bem econômica:
“Você poderia me doar um pacote de fraldas? Estou doente e completamente impotente. Sem saber mesmo o que fazer.”
Nem respondi, embora ela tenha insistido. As mensagens dela ficaram no vazio. Deu, né?
O que meus queridos leitores fariam? Ceder uma vez, ceder a segunda… quando isso iria parar? Seria como pagar a um chantagista achando, inocentemente, que ele pararia de chantagear. Será que sou a única pessoa que se dispôs a ajudar – da primeira vez – essa mulher? Ou entre o começo de dezembro e o começo de fevereiro ela infernizou o Instagram de outros tantos trouxas como eu? Quem sabe ela não criou um esquema cíclico, garimpando doações em vários perfis…
Onde isso vai parar?