Quando se fala em lugares onde se come bem em Paris, o que não faltam são boas opções. Durante vários anos, nós, jornalistas especializados na área publicitária, costumávamos passar por lá, após o Festival de Filmes Publicitários de Cannes, na Riviera Francesa. Sempre com a grana curta, fugíamos dos restaurantes famosos e íamos atrás dos bons e baratos “sujinhos” parisienses.
Houve um ano, no entanto, acho que em 1997, que alguns publicitários do Brasil se juntaram ao nosso grupo e, feito diabinhos, sopraram em nossos ouvidos: por que não uma experiência gastronômica, digamos, mais arrojada. A sugestão deles foi o restaurante La Coupole, em Montparnasse, um dos mais tradicionais da cidade.
Fundado em 1927, instalado num prédio com decoração art-decô, com uma grande cúpula ao centro, o local impressiona. Foi durante muito tempo reduto de artistas e personalidades francesas e internacionais. Passaram por lá nada menos que Picasso, Cartier, Buñuel, Henry Miller, Hemingway, Jane Birkin, Edith Piaf e Yves Montand, entre outros. Como nem tudo é perfeito, teria abrigado também reuniões da cúpula de oficiais nazistas durante a ocupação alemã.
Com as mãos no bolso, apreciava o cardápio e conferia se ainda estavam lá e quantos dólares eu tinha. Mas, já que “está dentro, deixa”, pensava enquanto degustava “huîtres au gratin” (ostras gratinadas) e outras delícias, acompanhado por aqueles vinhos maravilhosos que só os franceses têm. Até dei uma olhada, mas passei ao largo do famoso “large label rouge Brugundy snails”, nada mais que o famoso escargot. Disgusting.
Acompanhei a maioria nas trutas, lobster canadian (lagostas canadenses), tartare de carne de boi da Normandia, foie grass etc. Interessante, àquela altura, sob os eflúvios do vinho, até esqueci de recontar meu rico dinheirinho. Fechamos o cardápio com crème brûlée e, naturalmente, cafezinho e licor.
Comecei a suar frio, enquanto esperava a conta. Imaginava uma fortuna, da qual, evidentemente, eu não dispunha, e já me preparava para solicitar um empréstimo. Ali não seria tão complicado, cada publicitário daqueles ganhava, no mínimo, umas dezes vezes mais do que eu. Decidimos dividir por igual, independentemente do consumo de cada um, o que foi justo, pois consumimos praticamente as mesmas coisas. Quando me falaram o valor, deixei escapar um grito: “Só oitenta dólares!?”
À época (ainda não existia o Euro), a moeda americana era cotada no Brasil a 1,07 reais, ou seja, paguei aliviado pouco mais de 90 reais. Hoje, seria uns 400. Admito que nunca comi e bebi tão bem em toda minha vida. A propósito, o La Coupole continua aberto, com o mesmo glamour de sempre, com preços em conta, mas, segundo as más línguas, não com a mesma qualidade.
Dou de ombros, recomendo e pretendo voltar quando estiver de novo na capital francesa.
Manoel Dorneles
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