Aconteceu numa dessas manhãs friorentas, quando, ainda sonolento, fui abrir o portão para a entrada dos pedreiros. Não percebi que uma armação de ferro, dessas usadas em estruturas de concreto, tinha escorregado para o caminho. E daí buff!
O choque com o dedinho do pé esquerdo não foi muito forte, mas bastou para rasgar um pequeno talho junto à unha e abrir caminho para que alguns mililitros de sangue escorregassem para a meia branca.
A primeira coisa que me veio à cabeça, não sei exatamente por que, foi: ‘quem com ferro fere, com ferro será ferido’. Não fazia o menor sentido lembrar-me de um ditado na hora da raiva. Mesmo porque, para começar a merecer alguma lógica, eu teria de ter ferido primeiro, antes de me ferir. Provavelmente, minhas ideias foram abaladas pela topada e pela hemorragia, e daí o axioma emergiu inadequadamente.
Logo em seguida, porém – embora ainda sob efeito da dor, mas recolocando os pensamentos em ordem – reformulei a ideia, adequando-a a uma feição pragmática: ‘quem com ferro se fere, melhor tomar uma antitetânica’.
Não me lembro da última vez que tomei uma vacina dessas. Talvez ainda na adolescência, cinquenta anos atrás. Nem recentemente, coisa de há quatro ou cinco anos, quando tive um dedo da mão atacado por um prego enferrujado, fui procurar o posto de saúde. Confiei que minha irresponsabilidade não seria maior que minha sorte.
Desta vez, porém, fui – poucas horas depois. A confiança na sorte parece ter diminuído. Esperei uns poucos minutos e, depois de uma agulhada dolorida, ganhei uma cadernetinha de vacinação que, embora utilize o termo ‘adulto’, me pareceu um pouco anacrônica para minha idade. Uma caderneta de vacinação, depois de velho? Já me imaginei fazendo selfie com o Zé Gotinha e abrindo o berreiro para tomar uma tríplice viral. Senti-me, posso dizer, às portas de uma segunda (ou terceira?) infância.
Essa cadernetinha, eu sei, não vai me abrir portas. Não vou precisar dela para uma eventual matrícula escolar, ou como senha para receber presentes de Papai Noel na inauguração de algum shopping. Mas ela traz anotado que, nos dias 19 de outubro e 19 de dezembro, devo voltar ao posto e tomar a segunda e a terceira doses da antitetânica. Uma vacina que, segundo a enfermeira que carinhosamente me espetou, deve ser renovada a cada dez anos.
“Já tivemos casos de gente jovem que morreu por causa do tétano”, ela me avisou.
Pesquisei no Google: o tétano é uma infecção bacteriana possivelmente fatal que afeta os nervos. A vacina é eficaz na prevenção da infecção, que não tem cura. O tétano provoca contrações musculares dolorosas, especialmente na mandíbula e no pescoço. Pode interferir na capacidade de respirar e, eventualmente, causar morte.
E um detalhe, que me surpreendeu: não precisa ser material enferrujado o vetor da doença. A bactéria Clostridium tetani, causadora da doença, é encontrada nas fezes de animais e de seres humanos, na terra, nas plantas e em objetos vários, e pode contaminar as pessoas que simplesmente tenham lesões na pele. E eu sempre associei o tétano à ferrugem!
Como eu creio que a maioria dos meus diletos leitores – que não devem passar de meia dúzia de sete ou oito – não sabia disso nem teve tempo de se preocupar com o fantasma do tétano, fica aqui minha sugestão: bora colocar as vacinas em dia?
A tia vai dar uma carteirinha bacaninha para vocês colorirem!
https://www.youtube.com/watch?v=nGeKWHEgaRk
E pra isso não precisa antitetânica!
Nem pensar!! Eita vacina doida, sô!!
Nem pensar!!! Eita vacina doída!!
Vícios que adquiri na infância e reforcei, quando tive meus filhos: manter a carteira de vacinação em dia. Tomei a dT, em dezembro de 2020, depois de ir várias vezes à UBS, sem encontrar vacinas disponíveis. Acho que, de tanto eu procurar, providenciaram umas poucas doses, para atender os chatos que fazem questão de se vacinar ou que se ferem com ferro!