O professor aloprado

Há pouco mais de vinte anos, tive a ousadia de concorrer a uma vaga de professor substituto de Redação I do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Eu digo ousadia porque não sou do tipo acadêmico. Não sou conhecedor de teorias da escrita, linguística, estrutura da informação e outros badulaques. Principalmente, desconheço qualquer fundamento ou princípio ou noção de didática, de como dar uma aula.

Era – e ainda sou – um pé-de-boi. Um Fusca 66 com cabeçote rebaixado. Aprendi jornalismo sendo jornalista. Aprendi a escrever escrevendo (e lendo muito, claro). Como passar isso para estudantes que, na maioria das vezes, mal conseguiram responder às questões do vestibular, passaram raspando em língua portuguesa e conseguiram a proeza de não zerar em redação?

O edital de concurso pedia apenas graduação na área e experiência de cinco anos. Eu cumpria as duas únicas exigências. Curiosamente, não pediam que você soubesse escrever. Provavelmente, esperavam que tivesse na ponta da língua os esquemas teóricos de como escrever.

Minha teoria de redação jornalística resume-se à fórmula do lead: quem, quê, quando, como, onde, por quê. Terminei de expor essas noções básicas e terminou minha aula-teste, diante de uma bancada de professores (de verdade) de Jornalismo. Ponto final. Cinco minutos. Nem fui procurar saber do resultado.

Mas o que eu queria mesmo, se me dessem essa opção, era chegar e dizer:

Não sou professor. Não tenho noção de didática. Não conheço teoria de redação. Minha ideia é ensinar os alunos a escreverem como eu aprendi: escrevendo. E escrevendo, escrevendo, escrevendo. E eu corrigindo em sala, para que os erros de uns servissem de aprendizado a outros. Eu seria menos um professor e mais um editor. Minha experiência como editor de texto, aliás, tem-me angariado admiradores, modéstia à parte.

Seria por aí. Além disso, além de fazê-los escrever e escrever, eu os faria ler, ler muito. Quanto mais você lê, mas você adquire vocabulário, mais você conhece a estrutura das orações. Não há mistério: é ler e escrever. E ser exigente consigo mesmo, como ensina o professor de trezentos quilos Charlie (Brendan Fraser) em ‘The Whale’: revise várias vezes o que você escreveu e troque sempre de palavra, até encontrar uma que represente perfeitamente a sua ideia.

Só que, para trocar sempre de palavra, é necessário ter vocabulário. E para isso é preciso ler e ler e ler.

Marco Antonio Zanfra

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *