Paixões

Tive dezenas de paixões na vida, mas a mais avassaladora foi a que senti, aos 19 anos, pela atriz Françoise Forton. Amei a Virgínia que ela fez, de franjinha e tudo, na novela ‘Cuca Legal’, da Globo. Amei mais ainda quando ela interpretou a futura miss Maria Tereza na novela de época (anos 60) ‘Estúpido Cupido’, no ano seguinte. Foi uma paixão duradoura e inesquecível.

Minha paixão foi tão marcante – e meu acesso à Françoise real tão utópico, em contrapartida – que acabei elegendo uma espécie de avatar para substituí-la. Eu tinha amor para dar e precisava de uma pessoa real para recebê-lo. O nome dela era Sônia.

Nem de longe se parecia com minha musa, mas eu pus na cabeça que sim, era igualzinha, e então, como sempre fui uma pessoa pragmática, transferi para Soninha meu amor por Françoise.

O problema é que minha avatar, meu simulacro de Françoise Forton, também não estava lá muito acessível: era noiva havia algum tempo, com casamento marcado e tudo. Então, por transferência, passei a sofrer pela Soninha o que estava condenado a sofrer pela Françoise. Dá para entender? Paixão sem sofrimento não tem graça, haveremos todos de concordar, e portanto vamos lá sofrer.

A diferença, no caso, é que com a Sônia eu podia sofrer de perto; com a Françoise, eu sofria vendo-a aos beijos com Francisco Cuoco e, depois, com Ricardo Blat, mas era um sofrimento tipo de novela, roteirizado, passando na tevê, com começo, meio e fim. Era como apaixonar-se pela personagem de um livro, e depois esquecê-la ao concluir a leitura.

Com a Soninha, não! Era um aperto no coração encontrar-me com ela e saber que depois ela estaria com o noivo. Tivemos um romance meio incompleto e eu cheguei a ter esperança de que ela largasse o noivo para ficar comigo… Mas não: ela se casou, vive com ele até hoje, e olhe que lá se vão quarenta anos!

Mas foi melhor assim! Minha paixão transferida não me deixou ver, na época, que Soninha não tinha nada a ver comigo: era carola e eu, agnóstico; gostava de música romântica e eu, de heavy metal e música clássica; era uma típica mãe de família e eu, um jornalista bêbado que estava pouco me lixando para as sagradas instituições…

Acho que, se ela largasse o noivo para ficar comigo, nosso amo não duraria dois meses!

Conversei com ela outro dia e descobri que continua a mesma. É certo que eu também sosseguei um pouco o rabo, mas mantenho minhas convicções políticas, religiosas e musicais da época. Foi bom que não tivesse dado certo…

Mas eu ainda lamento não ter tentado com a verdadeira Françoise Forton!

(Este texto foi publicado originariamente no portal ‘Tudo Sobre Floripa’ em 14 de novembro de 2018, e é nossa homenagem à atriz, que morreu no domingo)

Marco Antonio Zanfra

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