Dúvidas felinas

De madrugada, quando me levantei tropegamente da cama para abrir a porta e deixar o gato sair, ele me fez uma pergunta e eu instintivamente o mandei calar a boca. Primeiro, porque não devia satisfações a um gato que me interrompe o sono no meio da noite. Segundo, porque não entendi a pergunta.

Mais tarde, já totalmente desperto, me vi diante de duas dúvidas: em primeiro lugar, o que ele poderia querer saber àquela hora da madrugada; em segundo lugar, gatos fazem perguntas?

Sim, porque, mesmo estando sonado e chutando o pé da cama com o dedinho do pé, tive certeza de que seu miado carregava uma entonação interrogativa. Nunca tinha ouvido um gato miar daquele jeito, mas isso não quer dizer nada, porque nunca prestei muita atenção a gatos. Mas que era uma pergunta, isso era!

Talvez ele tenha perguntado ‘será que está frio lá fora?’, ou ‘será que está chovendo?’, mas isso não faria muito sentido, porque ele ia sair e em instantes saberia por experiência própria se estava frio e se estava chovendo. Ou talvez ele tenha feito uma pergunta retórica, dessas que se faz num elevador a uma pessoa desconhecida, apenas para quebrar o gelo e o constrangimento do silêncio.

A verdade é que, ao final, fiquei sem saber que dúvida o tinha perturbado, porque, de manhã, ele mal olhou para minha cara. Pode ter ficado ofendido pelo fato de eu tê-lo mandado calar a boca. Ou pode ter conseguido por conta própria a resposta que procurava, e não dependia mais de meus vastos e mal-humorados conhecimentos para encontrá-la. Ou pode ser, efetivamente, que a pergunta dele não deixava de ser um papo de elevador.

Se quiser saber o que o gato pretendia, vou depender do conhecimento de pessoas que realmente conhecem desses animais. Minha velha amiga Célia Bretas Tahan, por exemplo, já me esclareceu que os bichanos sabem nadar e gostam de água, embora todas as imagens que vi até então indiquem exatamente o contrário. Vou conversar com ela.

Ou vou acabar me rendendo aos insistentes apelos da psicóloga veterinária Silvia Komatsu e comprar seu livro sobre o idioma felino. Quando eu falo em insistentes apelos, refiro-me a insistentes apelos mesmo: depois que, curioso como um gato, cliquei num pequeno anúncio sobre a obra, o ‘miaugoritmo’ bombardeia minha caixa de e-mail pelo menos duas vezes por dia.

Meu medo é que, entendendo finalmente o que o gato queria dizer, compreenda que a pergunta dele era ‘e aí, humano, pronto para virar meu escravo?’

Marco Antonio Zanfra

4 comentários

  1. Meu amigo, também há gatos aqui em casa. A primeira coisa que eu aprendi é que você não tem um gato. Ele é que tem você. Também gatos não fazem perguntas. Dão ordens! Eu tenho um sério problema com o meu gato mais velho… ele mia! Claro, isso não surpreende. Surpreenderia se ele latisse. Mas ele mia quando quer comer, mia depois que comeu e mia quando não tem coisa melhor pra fazer. Não lava um copo, não pega um livro pra ler… ele só come, bebe, dorme e mia! Dizem que no antigo Egito, você pagaria com a própria vida caso maltratasse um gato. Eram sagrados e essa lei era implacável! O meu aqui, vez ou outra, me lança uns olhares enviesados como que a me lembrar dessa lei. Eu, hein?

    • Mas dizem que os gatos eram enterrados com os faraós. Menos mal. E os bichos ou acham que a gente é surdo, ou que não entendeu o que eles querem, porque repetem até a exaustão! E esse de casa é um ‘castrato’: a voz dele não engrossou.

    • Dizem que os faraós levavam os gatos com eles para suas tumbas. Menos mal. Mas eu acho que os bichos pensam que ou somos surdos, ou não entendemos o que eles querem, pois ficam repetindo o pedido à exaustão. O pior é que o gato aqui de casa é ‘castrato’, e por isso mantém uma vozinha irritante de criança.

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