Os gatos já nasceram pobres. Porém, já nasceram livres. Por isso, não reconhecem senhor, senhora ou senhorio.

Para quem não conhece, é basicamente isso que diz a letra de ‘A história da gata’, da peça ‘Os Saltimbancos’. Pois eu demorei mais de quarenta anos para compreender a extensão do significado: os gatos não reconhecem senhor, senhora ou senhorio porque ELES SÃO os senhores, as senhoras e os senhorios de nós todos. Ou pelo menos pensam que são. Eles mandam, são donos de seu espaço, e a raça humana que se curve.

Já convivi com gatos em tempos remotos, mas não tinha reparado na amplitude do poder que eles pensam ter. Apenas agora, talvez embalado pela condição de velho desocupado que passa o dia (e a noite) em casa atendendo aos desejos de um felinozinho branco com toques de cinza, consegui compreender a relação deles com o mundo.

Consegui compreender, por exemplo, que o que move a gataria é o protagonismo. Eles são sempre os protagonistas. Para o bem e para o mal. Por isso, eles têm tanto espaço no Instagram, onde mostram tanto a fofura dos filhotinhos tenros e felpudos quanto a crueldade do ‘eu mando aqui’. Gatos são destruidores em potencial, vulcões adormecidos. Não dormissem dois terços do dia, não restaria pedra sobre pedra no planeta.

E por que o poder sobre os humanos, mesmo em condições de prejuízo latente? Porque eles são fofos, ora! Olham para nós com um olhar que varia da meiguice ao desprezo. Andam como se estivessem boiando e, quando não estão destruindo, transmitem uma sensação de preguiça que é contagiante. O gato é dono de seu espaço, mas nos deixa chegar perto, desde que nos comportemos.

Tem um vídeo na internet que fala das vantagens que é ter um gato: você deixa de ser sedentário, ao praticar exercícios físicos para recolher os pelos que ele solta; você se livra da alergia, porque seu sistema de espirros vai à exaustão; você pode evitar um ataque do coração, porque a quantidade de sustos provocados pelo bichano vai te deixar acostumado às surpresas; você se livra de problemas cardiovasculares, porque as unhadas carinhosas de seu gato vão te tirar tanto sangue que sua pressão sanguínea vai diminuir.

Confesso que parei de odiar gatos desde que o branquinho com toques de cinza elegeu minha casa como sua casa e, por um gesto de infinita bondade, deixou que eu continuasse morando aqui. Os gatos sabem cativar, sabem como fazer com que você os sirva e se sinta feliz por sua condição análoga à escravidão. Talvez por isso façam tanto sucesso, sejam sempre os protagonistas. Persuasão acho que é o termo.

Não deve ter sido por acaso que as belas mulheres eram chamadas de ‘gatas’ antigamente!

Marco Antonio Zanfra

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