Sei que a foto aí em cima não é recente, sei que não ficou assim de uma hora para outra, mas não consigo me esquecer de que eu acampava nessa praia no final dos anos setenta. Naquele tempo, o que havia em profusão era uma areia branquinha e fina, e não esses prédios todos. Dava para enxergar de um morro ao outro, sem uma construção sequer que atravessasse o raio de visão.
Para não dizer que era absolutamente ermo, havia um mercado com padaria logo no início, onde a gente comprava pão de forma e pomarola, que é a base inescapável das refeições campistas. Duvido que qualquer um dos moradores desses condomínios de hoje tenha atingido o nirvana, como nós, comendo pão com pomarola! Duvido também que tenham batido cobertores na porta da barraca, para descarregar o excesso de areia.
Era fácil chegar à praia de São Lourenço: a gente saía do centrinho de Bertioga, pegava a praia à esquerda, trafegava até próximo do morro – acho que a praia ali se chamava Indaiá – pegava um caminho tortuoso à esquerda, no meio do mato, e saía do outro lado do morro. Pronto! Era aquela imensidão de areia, com uma pequena faixa de restinga do lado esquerdo, com vegetação suficientemente alta para ocultar eventuais desforços fisiológicos que não deviam ser compartilhados com o público.
Margeando a restinga, havia um córrego com água quase limpa, boa o bastante para o banho no final do expediente. A água para beber provinha de outra fonte: uma bica no alto do morro havia sido coletada com canos de bambu e chegava quase ao nível do chão. Nosso colega Evanir Rodrigues da Silveira, o ‘Gaúcho’, saudoso fotógrafo da Agência Folhas, dizia que tinha sido ele a canalizar a biquinha.
Na ponta do morro, havia um conjunto de pedras grandes, uma espécie de costão, que vivia em constante disputa com as fortes ondas do mar. Da última vez que acampei em São Lourenço, cheguei descuidadamente à beira de uma das pedras e fui derrubado pela arrebentação da onda, mergulhando na água fria e ralando os dois braços na aspereza da superfície rochosa. Só não morri porque anjo da guarda de bêbado faz parte da tropa de elite.
A gente podia ganhar salário mínimo e frequentar São Lourenço. Hoje, nem as faxineiras de lá se contentam em ganhar tão pouco. Os moradores locais são de outro nível. Até nosso amigo Nereu Leme, idealizador do blog ‘Contando História’, morou lá. Acampar em São Lourenço? Só se for nos jardins diante dos condomínios. E isso se a fiscalização permitir…
Acho que não. O camping selvagem acabou quando começou a acabar a solidão bucólica da praia de São Lourenço.
É, entendo perfeitamente sua desolação, se assim podemos dizer. No final dos anos 2970, quando da época da Agência Folhas, Diários Associados, fomos umas duas vezes acampar em Trindade. Uma maravilha de difícil acesso, isolada, rústica, selvagem.
Voltei lá 4 anos atrás, quase não reconheci a velha Trindade, hoje, urbanizada, super-explorada, caótica.
Voltei lá três anos atrás e não
Desculpem, tô sendo muito futurista. Em 2970, acho que não haverá nada ao nível do mar. Quis dizer final dos anos 1970