Recebi outro dia uma mensagem de texto no WhatsApp que, aparentemente, provinha de uma antiga vizinha. A mensagem dizia apenas “troquei de telefone, estou usando este agora”.
Para prosseguir na narrativa, é necessário situar essa vizinha no contexto:
Vivemos em casas próximas durante nove anos, quando morávamos na Lapa, entre 1983 e 1992; ela viu minhas duas filhas nascerem e foi parte integrante da infância delas; vivíamos numa vila com oito casas, numa rua sem saída, e quase todos na vila éramos como uma grande família.
Quantas vezes minhas filhas não almoçaram ou jantaram na casa dela? Quantas vezes ela própria, ou uma de suas filhas, não foi buscar minhas meninas na escolinha? Quantos pequenos afazeres trocamos, quantas receitas, quantos pratos de comida, coquetes, pizzas, pastéis de forno, tortas e pudins não dividimos?
Pois houve a mudança, mas não perdemos contato. Ainda que esporadicamente, nos falávamos por telefone ou por WhatsApp. As meninas que ela viu nascer já estão beirando os quarenta e já me deram netos. Mas ela não deixou de me tratar como se estivéssemos próximos, continuou a me chamar de ‘Marcão’, nossos contatos sempre foram de extrema familiaridade e carinho.
De modo que ela nunca se limitaria a dizer ‘troquei de telefone, estou usando este agora’!
Mas deixei rolar. Perguntei se estava tudo bem e informei que seu novo telefone já estava devidamente ‘cadastrado’ entre os meus contatos. No dia seguinte, em seu ‘novo’ telefone, a ‘vizinha’ veio com aquele papo que eu tinha certeza de que ia rolar: disse que estava num apuro momentâneo, que precisava depositar R$ 5 mil na conta de uma credora, e garantiu que me restituiria o valor no dia seguinte.
Disse que estava impossibilitada de mexer na conta bancária naquele momento, mas que no dia seguinte teria como pagar. Concordei em fazer o depósito, ela me passou o número da conta, mas resolvi jogar com a pessoa que, obviamente, era um golpista. Comecei:
“Beleza, vou fazer o depósito daqui a pouco, mas eu queria aproveitar para falar com seu marido. Tenho um assunto pendente para resolver com ele. Pode chamá-lo?”
“Ele não está em casa agora! Não pode ser depois, mais tarde, ou amanhã?”
“Tudo bem. Falo com ele amanhã, então. Faz um favor: pede para ele estar em casa nesse horário, que é para a gente poder conversar…”
A ‘vizinha’ concordou e deve ter ficado esfregando as mãos, esperando meu depósito, que obviamente jamais seria feito.
Porque a pessoa que tentou se passar por minha ex-vizinha não sabia que o marido que ela garantiu estar em casa no dia seguinte para falar comigo tinha morrido havia oito anos!