Cuidado ao atravessar a rua, cuidado com o cachorro bravo, olha essa língua, cuidado com a carteira, leve o casaco que vai esfriar, não brinque com fogo, não pise no chão frio. Não importa a idade, todos nós, em algum momento de nossas vidas, já ouvimos tais recomendações. Quase nunca lhes demos muita atenção, mas privilegiados são aqueles que ainda as ouvem.
Mãe, mamãe, mainha, mammy, mã, a denominação é o que menos importa para essas senhorinhas de 20, 30, 40, 50, 60 anos ou mais, algumas ainda de cabelos coloridos ou pretos com alguns fiozinhos brancos aqui, outros acolá, outras com a cabeleira inteiramente grisalha. Elas são a prova mais evidente de que “quem ama cuida”. E como cuidam.
Crescemos, tomamos cada um seu rumo, e elas lá a se perguntar “meu Deus, e agora, quem vai cuidar deles?” – as mais tradicionais têm até um terço na mão. Abusavam do telefone, agora das redes sociais e, de uma forma ou de outra, tentam manter contato todos os dias, para o desgosto das noras ou dos genros. Claro que não confiam, de jeito nenhum nessa desconhecida (ou desconhecido), que um dia nós selecionamos para continuar a jornada ao nosso lado.
No caso dos filhos (homens), as mães têm certeza de que eles não têm a mínima competência para escolher alguém que, em última hipótese, vai ocupar o lugar delas. “Tadinho, tá tão magrinho, ela (entredentes, “aquela megera”) está lhe tratando bem?” “Sabe, ao menos, cozinhar?” “Nossa, quem passou essa camisa?”, costumam perguntar na mesma voz “tatibitate”, que usavam quando tínhamos dois, três anos. Em certa medida, são mais tolerantes com a escolha das filhas. Parecem mais conformadas, pois “as treinaram bem”, e até satisfeitas em saber que terão mais um “filho” pra cuidar.
Mãe é isso, aquilo e um pouco mais. Há, evidentemente, mulheres que abominam a ideia de ser mãe (ou fazem de conta que abominam) e descontam tudo no trabalho; chegam a ser insuportáveis de tão dedicadas. Há outras, no entanto, que nascem com esse instinto apurado; exageram. São mães em tempo integral. Acarinham e cuidam do namorado, do marido, do filho, dos colegas de seção, do pedinte da esquina, do cachorro, gato, papagaio. Sufocam muitas vezes.
Notem que até agora, falamos de cuidados e carinho como se fossem complementares, e são mesmo. No entanto, há várias formas de carinhos. Pode ser intenso ou suave, pode ser um toque, uma palavra, um olhar, um gesto, um alisar de cabelo. Como bem disse a publicitária Tati Bernardi “não é só tesão, porque eu passaria o resto de minha existência fazendo carinho nos seus cabelos”.
Conheço avós (mães em dose dupla) que nunca botaram um neto no colo, mas que extremamente carinhosas, olham com ternura, acolhem, sorriem, se doam. Pessoas que não abraçam, não beijam, mas sabem a hora exata de quando necessitamos de um “colo”, uma palavra, de um incentivo, um apoio.
Claro, discernir o que é carinho exige um longo aprendizado, principalmente quando estamos longe de nossa zona de conforto. Caso contrário, temos que concordar com Fernando Sabino, que escreveu “Não confio em produto local. Sempre que viajo, levo meu uísque e minha mulher”. Melhor ficar com Cássia Eller que afirmou um dia: “O que a gente gosta, a gente guarda. Quem ama a gente, a gente cuida. E pro resto, a gente mostra a língua.”
Manoel Dorneles
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É como dizem: “O que os olhos não veem, mainha acha, e ainda esfrega no seu nariz!”