Não entro numa sala de cinema desde 1994. Portanto, não tenho parâmetros para analisar como se encontra hoje o ambiente para se ver tranquila e prazerosamente um filme. Mas, pelo que leio por aí, o que menos dá para fazer atualmente num cinema é ver tranquila e prazerosamente um filme.
O que me levou a me afastar das salas – a presença de outras pessoas – simplesmente atingiu seu maior grau de insuportabilidade. O que não deixa de ser um exagero, porque o insuportável pode sempre ser mais insuportável ainda.
Em 1994, na flor de meus trinta e oito anos, o passa pra lá e passa pra cá, as conversas audíveis pelo salão todo, o barulho de mastigação e o burburinho comum em ambientes fechados e cheios de gente eram intoleráveis para as pessoas que, como eu, pagaram o ingresso apenas para deliciar-se com a arte cinematográfica.
Os outros pareciam estar em suas próprias casas, na final de um campeonato escolar de gritarias ou na festa de despedida de um cursinho básico de como se tornar um troglodita. Não dava para aguentar.
Sou do tempo em que o máximo que se permitia no escurinho do cinema era um amasso um pouco mais ousado – com a mão por debaixo da blusa da namorada, se muito – mas em obsequioso silêncio. E, claro, na parte mais escura e longe dos demais espectadores. O escurinho do cinema era um convite à lascívia antes da popularização dos motéis. E, mesmo que os amassos atingissem graus mais ousados, não me lembro de ninguém reclamando de orgasmos ruidodos durante um filme.
Agora, pelo que leio, o público canta em voz alta a trilha sonora dos musicais, conversa em volume exagerado, usa desmedidamente os celulares e sai da poltrona para dançar diante da tela (especialmente, como na imagem, no filme sobre a turnê de uma tal de Taylor Swift). Age como se não houvesse amanhã ou qualquer outro espectador que estivesse ali simplesmente para assistir ao filme.
A falta de respeito com os demais espectadores chegou ao cúmulo de, acho que no Recife, a polícia intervir para enquadrar um grupo que fumava maconha durante a sessão.
Desde que parei de frequentar os cinemas, acho que não perdi muita coisa – além de ver as imagens numa tela enorme. Tornei-me primeiro um adepto do videocassete, depois do DVD e, finalmente, do Torrent. Há anos baixo filmes pela internet, alguns até antes do lançamento oficial. Não descarto também o acervo da Netflix.
Todos os filmes de minhas sessões particulares são degustados numa tela de 58 polegadas, a partir de uma poltrona espaçosa, podendo parar na hora em que quiser e, principalmente, sem ninguém fazendo barulho, conversando em voz alta ou mastigando perto de minha orelha.
Sobre minha última incursão numa sala de cinema, em 1994, só estou em dúvida se foi para ver o filme ‘Os Flintstones’ em Cuiabá ou ‘Débi & Lóide’ em Blumenau.