Tive uma agradável surpresa ao dar uma passada pelo supermercado, numa destas manhãs: colocaram uma menina lindíssima no caixa. Em torno de vinte anos, longos cabelos castanhos ondulados, límpidos olhos verdes e um sorriso perfeito de dentes perfeitos.
E colocaram a moça no caixa preferencial, a esteira por onde circulam os velhos babões, como eu. Faltou colocar um cartaz amarelo, tipo display, alertando que o piso poderia estar escorregadio.
Fiquei tão embevecido com a beleza da garota que ia me esquecendo de uma caixinha com uma dúzia de ovos sobre o balcão. Mas ela me alertou: “Ai, moço!”, me passando o produto. Pensei em dizer “você diz isso pra todos (chamar de moço)”, mas minha garganta trancou e o máximo que consegui expelir foi um sorriso frouxo.
O supermercado fica à beira da rodovia, a cerca de um quilômetro e meio de casa, e eu costumo ir e voltar a pé. Passei boa parte do caminho de volta tentando arquitetar o que poderia escrever no blog sobre a musa do dia. Estava tão absorto que por pouco não fui abalroado por uma bicicleta, enquanto tentava desviar de um carro parado irregularmente no acostamento.
Seria a segunda surpresa do dia, mas nem de longe agradável como a primeira. E o detalhe curioso é que, se o veículo me acertasse, atingiria exatamente a caixa de ovos que eu ia esquecendo em cima do balcão.
Bicicleta é um bicho sorrateiro. Não faz barulho, e você só percebe sua presença quando ela está perto o suficiente para dar o bote. Os ciclistas trafegam pelo acostamento e imaginam que os pedestres que dividem o espaço com eles andam sempre em linha reta, não tropeçam ou não resolvem parar de uma hora para outra para coçar a perna. O índice de atropelamentos nessas circunstâncias é, porém, estranhamente baixo.
No caso desta vez, o ciclista gritou “opa!” quando estava praticamente em cima de mim, mas tive tempo de puxar o braço e, principalmente, salvar a caixinha com ovos. Nada mal para quem começara o dia com a inspiração de um par de límpidos olhos verdes.