Escolher como morrer

No filme ‘Soylent Green’ – uma distopia de 1973 dirigida por Richard Fleischer, cujo título em português era ‘No ano de 2020’ – o personagem de Edward G. Robinson, Sol Roth, desacreditado da vida, resolve morrer em paz. Procura então um lugar chamado Casa, especialista em suicídio assistido, e ali escolhe como ir-se deste mundo cruel.

Sol, que era parceiro do policial Robert Thorn (Charlton Heston), escolheu morrer em quarenta minutos, com uma luz alaranjada dominando o ambiente, ao som de ‘música clássica suave’ – ouviu trechos da Sexta de Beethoven e Morning Mood, de Grieg – e vendo cenas num telão, enquanto respirava para a morte, que mostravam animais fofos, natureza, cachoeiras, flores… Morreu feliz?

No Brasil, isso seria impensável. O suicida que atingiu seu objetivo é obviamente inimputável. Mas ‘induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a praticar automutilação ou prestar-lhe auxílio material para que o faça’, segundo o artigo 122 do Código Penal, pode resultar numa pena, caso o suicídio se consuma, de dois a seis anos de reclusão. Há ainda outras agravantes da pena nos sete parágrafos do artigo, mas isso não vem ao caso.

O importante é que, se você quiser morrer, só pode fazê-lo por seus próprios meios: afogue-se, pule de um prédio, dê um tiro na cabeça, tome veneno… O ato de buscar a própria morte tem de ser traumático. Morrer em paz, valer-se da suavidade de uma eutanásia, não é permitido por lei. Você não escolheu nascer e tem sérias restrições se escolher morrer.

Há países em que a eutanásia é aceita, porém. A Suíça é um deles. Recentemente, a estudante de veterinária Carolina Arruda, de 27 anos, abriu uma ‘vaquinha’ on-line para custear sua viagem para morrer em paz. Carolina alegava não suportar mais ‘a pior dor mundo’, decorrente de uma neuralgia do trigêmeo, e decidiu partir. Não sei a quantas andava sua arrecadação, mas ela desistiu temporariamente da viagem, diante de um tratamento alternativo para o mal. Não sei o que vai fazer com o dinheiro.

O ator francês Alain Delon, de 88 anos, também manifestou o desejo de ter morte assistida na Suíça, mas o assunto acabou esfriando. De qualquer forma, a Suíça parece representar o eldorado das mortes dignas. E por isso, para ‘manter a freguesia’, não abandona a inovação. A última novidade é a Sarco, uma máquina de suicídio assistido (imagem que ilustra o texto) que poderá ser acionada pelo próprio suicida.

Depois de passar por uma avaliação psiquiátrica, o candidato a morto aperta um botão dentro da câmara fechada e libera nitrogênio. “Não posso imaginar uma forma mais bonita de respirar ar sem oxigênio até cair no sono eterno”, disse Florian Willet, diretor da The Last Resort, entidade que promove a eutanásia. De uma empresa na Suíça – que pode usar a máquina cujo nome remete a sarcófago ainda este ano – à proliferação no mundo todo, quem sabe em quanto tempo as pessoas vão poder escolher como morrer?

Marco Antonio Zanfra

Um comentário

  1. Como diz o poeta Ednardo “porque cantar parece com não morrer , é igual a não se esquecer que a vida é que tem razão”. Concordo, a vida sempre tem razão, “enquanto engomo a calça”, sigo cantando e vivendo…

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *