Estava eu outro dia com meu majestoso labrador perto do portão de casa, observando pacientemente a tarde cair, quando uma gentil senhorinha parou na rua e elogiou a beleza do espécime – o de quatro patas – e perguntou a idade dele. Dez anos, respondi. E então ela comentou, como se fosse a coisa mais natural do mundo: “Ah, já está velhinho, tem uns setenta pela idade dos homens…”
Não, minha senhora, eu quis responder! Ele não tem setenta pela idade dos homens porque ele é um cachorro, não sei se a senhora percebeu! Ele tem dez anos como cachorro e jamais pretendeu agregar à sua parca capacidade cognitiva a experiência de vida, o conhecimento e a sobriedade de um homem de setenta anos!
Por que essa mania de colocar as coisas pelos padrões antropométricos? Um cachorro é um cachorro – aliás, nunca vi fazerem esse tipo de comparação com gatos – tem sua vida de cachorro, seus padrões de cachorro e sua expectativa de vida de cachorro. Vive bem menos que o homem, mas nem por isso suas finitudes podem ser matematicamente equiparadas.
Se um cão vivesse um décimo da vida de um humano, não significa que você poderia multiplicar cada ano de vida do animal por dez para saber o quanto ele teria vivido se fosse humano. Simplesmente porque ele não é humano.
E o pior é uma certa padronização de cálculo: cada ano do cachorro vale sete ou sete anos e meio do humano, como se os cães tivessem todos a mesma expectativa de vida e como se os homens tivessem como parâmetro chegar aos cem anos. Segundo o IBGE, nossa expectativa média de vida está em torno de 76 anos; os cães de raças grandes, como meu labrador, podem chegar no máximo a 13 anos – e os de raças pequenas, até a 18 anos.
Portanto, dividindo-se 76 por 12, teríamos cada ano de meu cão equivalendo a 6,3 anos da minha vida, e então ele teria 63 anos – exatamente a idade de seu dono. Se ele fosse um cachorro de raça pequena, teria, matematicamente, 42 anos.
Mas, reafirmo, tudo isso é besteira. Os cães não estudam, não leem, não somam experiências, não absorvem o que os humanos absorvem ao longo dos anos. Eles fazem o que os cães fazem: roem ossos, latem para os estranhos, correm atrás da bola, enrolam-se e dormem em qualquer cantinho. E se eu jogar uma bolinha de borracha no chão de casa, tenho certeza de que meu labrador de dez anos vai correr atrás dela. Duvido que um velhinho de setenta anos faça o mesmo!
Contando História
O que o tempo altera e vira história
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