Tem um vídeo no Instagram que mostra um pequeno cão carregando na boca um bicho de pelúcia maior que ele e se aproximando timidamente, como quem pede para brincar, mas sabe que pode ser rejeitado. A legenda diz tudo: ‘Não se esqueça de que você é o melhor amigo dele!”
Esse vídeo mexe comigo, porque eu me esqueço sempre de que sou o melhor amigo do meu cãozinho, me irrito com sua insistência para brincar e às vezes o empurro com os pés – inutilmente, sempre! – para afastá-lo de minhas pernas com sua cara de moleque. O vídeo mexe comigo, porque provoca uma forte sensação de remorso. Mas não altera meu comportamento, como eu acho que devia.
É certo que meu ‘melhor amigo’ não é um cãozinho com um bicho de pelúcia maior que ele na boca, mas um filhote de labrador que completou sete meses neste dia de Santo Antônio e já pesa mais de vinte e cinco quilos. Sua insistência para brincar não é um olhar tímido e uma caminhada hesitante, mas uma imposição de força: não pode me ver sentado, usualmente vendo algo no celular, que empurra insistentemente um grande osso sonoro de silicone contra meus joelhos, exigindo que eu entre no ritmo.
No começo, era mais fácil: você jogava o osso, ou outro ‘brinquedo’ qualquer, ele corria a buscar, não resistia muito para devolver e lhe dar chance de lançar de novo, e se cansava com facilidade, deixando-o a voltar ao que estava fazendo antes.
Mas ele cresceu. Demora muito mais a se cansar. Seus dentes ficaram mais resistentes e você não consegue arrancar o brinquedo de sua boca com a mesma facilidade. E ele está mais forte, bem mais forte. Resumindo: o que era antes a brincadeira de jogar algo para o cãozinho buscar tornou-se um cabo de guerra, com o cão e o melhor amigo dele puxando, um de cada lado, para ver quem fica com o brinquedo. Desnecessário dizer quem está vencendo a maior parte das vezes.
Acho que no fundo o filhote não deu sorte com os melhores amigos que escolheu: dois idosos sem muita paciência para brincar e aguentar no colo um mastodonte que cresceu sem se aperceber disso. Ele deve se achar como aquele cãozinho do vídeo, que carrega na boca um bichinho de pelúcia maior que ele. Mas que, daqui a pouco, vai ter porte para carregar entre os dentes o melhor amigo dele. Ou seja, eu.
Marco Antonio Zanfra