A hora e a vez do corno

Algum de meus queridos leitores sabe quem foi Manuel Duarte de Aguiar? Pois aposto que ninguém terá a resposta sem consultar o Google. E, mesmo assim, dificilmente encontrará mais do que algumas três ou quatro linhas sobre ele. Isto porque Manuel foi apenas a carta colocada fora do baralho, o peão da rainha sacrificado no jogo de xadrez da vida, o passado a ser esquecido, por inócuo, de uma mulher – ela, sim – que acabou se tornando uma figura histórica.

Mas justamente por ter sido apenas a sombra por trás de uma lenda, não seria justo que os mecanismos de busca lhe dessem um pouco mais de espaço? O fato de ter sido abandonado à própria sorte pela mulher sedenta de aventuras e notoriedade, não lhe garantiria o papel de vítima? Ou, pelo menos, o papel de um pobre corno, abandonado, desprezado e diminuído, pela própria condição de coadjuvante?

Manuel era sapateiro, pobre, inofensivo, introspectivo, e apesar disso casou-se com a futura lenda quando ela tinha quatorze anos. O casamento não durou muito, porém. E vários autores que escreveram sobre a mulher atribuíram a ele o fracasso pelo matrimônio: por não dar a ela a devida atenção, por não lhe fecundar o ventre durante os dois anos em que conviveram, por não ser forte o suficiente para opor resistência ao aventureiro que lhe arrebatou a prenda.

Há quem diga que o marido traído foi preso pelo próprio raptor da esposa, torturado e talvez morto. Mas quem se importou em comprovar a informação? Quem se ocuparia com a vida de alguém que não passaria de uma nota de rodapé na biografia da mulher?

O fato é que Ana Maria de Jesus Ribeiro saiu de sua vida e o interesse por ele também foi embora. Zero à esquerda. Ninguém procurou saber como o marido abandonado ficou após o desenlace – e isso, claro, desde que tenha continuado vivo. Houve alguém que lhe tenha oferecido o ombro amigo? Houve alguma espécie de apoio da família, tanto a dele quanto a da ex-mulher? Alguém tentou conhecer sua perspectiva de vida após o episódio de perfídia?

Se alguém se importou com o que restou dele, essa informação não foi parar em livros. Alguns historiadores, inclusive, sequer citaram que a tal heroína havia sido casada antes que o aventureiro a arrebatasse do lar. Como eu disse, zero à esquerda. Sua vida só mereceu algum interesse durante o curto período em que conviveu com a mulher. Suas luzes se apagaram quando ela foi embora. O que aconteceu com ele… ora, quem se importa?

Por isso é que centrei o texto nele como personagem. Por isso é que sequer citei o nome ‘de guerra’ da mulher que o abandonou. A hora e a vez são dele! Espero que minha intenção não seja encarada como machista. É apenas a de um jornalista que busca, por força da profissão, ouvir a versão de todos os lados. Ou a de um ser humano que se penaliza com o sentimento dos cornos. 

Marco Antonio Zanfra

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